Todos os dias ele acorda deitado, abre os olhos assustado e tentar mover as mãos. Em geral, consegue se mover, mas às vezes a força lhe trai e então ele grita, mas ninguém ouve.
Então ele ora, se esconde em baixo do cobertor e agradece por estar vivo, senta na cama, respira fundo e sente o sangue quente levar oxigênio para todo o corpo e pensa: "o ar que me vive, me mata". Os dias são quase sempre iguais. Cortar as pontas dos dedos com o aço, entortar os dedos com força, abaixar, levantar, parafrasear coisas estranhas na cabeça, principalmente no espelho. Mental, claro. Não há tempo para se olhar no espelho.
Sempre diz coisas como "o trabalho dignifica a alma" e "se ama algo de verdade, o liberta. Por que, se voltar, é por que sempre o teve e se fugirem, é por que nunca foi seu de verdade", mas só sabe que trabalho e amor estão longes no dicionário, tampouco onde a liberdade fica; Carrega um sorriso discreto e se diz como as estrelas, não grande e brilhante, mas inflado de gás e se sente pronto a explodir. BOOM!
A tarde, um banho morno. O Sol castigou-lhe a pele e a água morna escorre entre os cabelos, formando filetes de água menos morna que pode ser sentir por cada célula de pele e pêlo por onde passa. Fecha os olhos e se concentra na vida como se o universo fosse um local escuro e ele magicamente flutuasse e emitisse luz suficiente para ser a única coisa visível ao redor: se sente sozinho. Então ameaça chorar, mas lembra que o mundo lá fora ainda espera por ele. Corre, veste-se e percebe que a blusa não lhe caiu bem, então troca as meias curtas. Sai, dá de cara com o verde da natureza, respira fundo e tosse, será que é gripe? Não tem tempo de pensar nisso e corre logo para o bar, se senta num banquinho sente as cordas que lhe cortaram os dedos e resolve trocar: pega um nylon. O ataque é mais macio, mas o machucado continua lá e dói da mesma forma.
A noite ele volta, toma outra banho, exausto, e percebe que esqueceu de tirar a cueca: "mas que droga", lava-a e põe atrás da geladeira. Vai se deitar, olha para o teto e recomeça tudo: ' até que a morte nos separe'. Engraçada a frase, por que se existir uma vida após a morte, qual morte nos separa? Aliás, se a gente casa, pra que separa? Pensa nas respostas, não as tem. Pensa nas perguntas, mas elas já se foram e de rente, quando fecha os olhos, vê outros olhos: "Olho vermelhos como sangue, brancos como a neve, amarelos como o ouro, verdes como a campina, azuis como o céu. Queria eu poder enxergar longe, com olhos estes, que me vigiam toda a noite. "
E Amanhã ele acorda, e vive tudo de novo, uma nova paródia, uma nova Rapsódia.

São dias e dias que se vão... pedi a conta já faz tempo. Aliás, iria adiantar contar?
Eu olho pros lados, te procuro nas praças, navego nos mares e as vezes me sinto voando pelo céu mas você não está lá. Tenho a paciência de uma criança e, se quer saber, já não quero esperar como foi desde sempre. Não há conforto na dor, nem júbilo na solidão! Sou um Homem de Cruz e Espada, de coração menino e um peito juvenil, sou filho de uma terra verde, manchada de preto e com sangue recém derramado. Busco o teu tom nas minhas músicas, busco teus olhos nos meus e procuro os teus calos nas minhas mãos.
Não sou tão austero, não sou forte o suficiente e por mais que eu corra, o coração acelera de mais e os pulmões doem. Eu te perco. Ouço os ecos e choro, abro sorrisos e choro. Sento e grito, mas não há dor ou voz, ninguém me ouve. Me perco nas palavras, o dicionário não faz sentido e não existem línguas nem palavras o bastante. Por que ninguém me entende, Pai? Eu só quero te ver, abraçar, sentir, beijar! Um homem que eu amaria, amei e amo. Um homem de reputação, de cicatriz, de atitudes e de amor! Meu Deus, um homem de amor!
As avenidas engarrafam, as ruas têm o chão quebrado e as pontes despencam... os becos estão sujos e os templos perderam a perfeição, não existem teus vestígios. Meus modos de você se perderam, os elos que eu tinha forjado foram trucidados pelo tempo, o tempo bate, e bate e bate. Não consigo responder, acho que nem consigo pensar, tão triste a situação que nem chorar mais eu consigo. Eu ando longe, tão leve que nem sei se ando ou flutuo e tão pesado que não sei se ando ou caio. Essa é a minha luz e minha escuridão: juntas, lado a lado como um só caminho e sem um aterro. Um aterro onde eu possa cavar e remexer a terra, me disseram que se eu cavasse muito fundo eu ia chegar do outro lado do mundo, mas parece que a verdade é o inferno abaixo de nós, mas bem abaixo, no nosso próprio chão. Aos poucos os meus fios se arrebentam, já são 16 anos e hoje, especialmente hoje, sinto sua falta mais do que nunca e não te vejo em nenhum canto. Nem no teto, nem no espelho. Aos poucos a tua imagem me some e só resta a esperança de chegar ao outro lado para ti. Se é que eu vou poder, afinal é dificil achar alguma coisa que me recompense. Não quero que pareça ingratidão, Pai, mas é muito ruim travar batalhas e ver a glória fluir para outros brasões: quem sou eu senão um "sceadungengan" que só vive nas sombras por que quis?
Minhas cores estão desbotando... Eu quero sorrir, Pai, mas me falta você. Me falta um mundo, sem você.

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